terça-feira, 15 de agosto de 2017

28/1 - 8/10 Texto - Hotel


O pai, inglês perfilhou-o, mas não chegou a conhecê-lo. A mãe abalou para Inglaterra arrás dele. Quem o criou foi a avó. Sem deixar faltar nada ao neto, orgulhava‑se de serem pobres mas honestos.
Quando tinha sete anos aconteceu algo que o marcou. Invejou o estojo novo de um colega e tentou roubá-lo. Fê-lo tão mal que o viram.
Chamaram a avó à escola. Só pensava que do seu orgulho passara à sua vergonha. Da janela da sala do director viu-a a chegar. Com os seus passos curtos, meio curvada, mas a tentar olhar todos de frente. Quando ela assomou à porta, desabou a chorar: “não torno mais, vó, não torno mais”.
E avó não gritou, nem se zangou. Chorou com ele.
Decidiu que seria honesto sempre.

Sempre? Talvez não completamente. Com dezoito anos, apenas o 9º ano e não querendo emigrar para não deixar a avó, quando abriu a vaga para recepcionista no Hotel, mentiu. Disse que falava inglês. Com pai inglês, acreditaram.

Na primeira semana chegou ao hotel o grupo de rock Steel-Stone e estariam a recuperar do voo e diferença horária.
Esperava uma noite tranquila, mas pelas três da manhã tocou o telefone e era o líder, Roger, a gritar algo que lhe soou como: ” I’ want a portuguese stripper singer”.
Apelou ao que aprendera de inglês, lembrando-se da prima Gracinha que cantava num rancho. Não se recordava era do queria dizer “stripper”.
Ligou-lhe e ela acedeu a vir com dois elementos do rancho.
Quando chegaram, a prima um pouco mais gorda, todos vestidos com trajes regionais, levou‑os à suíte principal.
Estava muito barulho e não o deixaram entrar.
Nem meia hora depois, passavam por ele a correr a prima e os elementos do grupo, afogueados e meios despidos.

Ainda hoje a prima não lhe fala.

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